sábado, 19 de dezembro de 2009

Lições de oftalmologia

- Qual é a principal causa de cegueira no mundo?

- Catarata?

- Não, Glaucoma. Catarata é no Brasil.

Com paciência e riqueza de detalhes, o médico residente Frederico Lírio dá uma aula de oftamologia para quatro "bandeirantes". Eles estão na Escola Orlyene, centro de Ivinhema, onde oito oftalmologistas examinam, das 8h às 16h, a população carente da cidade. Passam por lá, diariamente, entre 150 e 170 pessoas. Todas estiveram antes em um posto de saúde e já chegam com emcaminhamentos.

O atendimento é constante. Não para nem em domingos ensolarados, como o de hoje. Há apenas uma pausa, para o almoço, das 12h às 13h. O intervalo divide a jornada em dois turnos: manhã e tarde. A cada período, quatro ou seis estudantes de Medicina se revesam para aplicar questionários epidemiológicos. No final do turno, quando o movimento diminui, vem a parte mais legal: assistir à aula dos residentes do Hospital Central (HC) de São Paulo e mexer nos aparelhos.
Em uma folha sulfite, o oftalmologista detalha a estrutura do olho humano. Fala também da formação da imagem e dos problemas de visão relacionados a ela, como miopia e astigmatismo. Os estudantes são constantemente arguidos. É uma espécie de revisão dos conceitos aprendidos na faculdade. “Presbiopia é corrigida com lente positiva ou negativa?”, pergunta Lírio.

A parte teórica não dura mais que 15 minutos. Os estudantes vão logo conhecer os equipamentos de uma consulta oftalmológica. O primeiro deles é o Auto-refrator, que estima quantos graus o paciente "tem". Em seguida, os estudantes conhecem os curiosos aparelhos de Biomicroscopia e Fundoscopia. O primeiro analisa a parte anterior do olho (córnea, íris) e o segundo a parte de trás (retina, nervo ótico). Por último, eles conhecem o aparelho da Refração, que indica qual lente fica melhor no paciente. De funcionamento mais simples, ele é muitas vezes operado pelos próprios estudantes, sob supervisão dos residentes.

Os aprendizes demonstraram um interesse concentrado, embora muitos não tenham decidido ser oftalmologistas. “Eu gosto bastante de ficar aqui. Dá para aprender conhecimento específico que está faltando na faculdade”, comenta a estudante de Medicina da USP Fernanda Baeto.

Para Frederico Lírio, mesmo que a oftalmologia não seja a especialidade escolhida por seus pupilos, os ensinamentos da Bandeira podem ajudá-los nos dignósticos e encaminhamentos que farão. "Eles vão lidar com a oftalmologia de uma outra forma", diz.

De todo modo, a convivência aproxima os estudantes desse ramo da Medicina: "É uma maneira de chamar a atenção dos alunos para a nossa especialidade, que tem um caráter muito forte de inclusão social”, comenta Lírio.

Visita à Dona Clemência

Dona Clemência Maria de Jesus é uma senhora baiana com uma risada incansável, que por acaso do destino veio morar Ivinhema. Ao longo de sua vida passou por uma Guerra Mundial, duas ditaduras no Brasil, a redemocratização, o nascimento da internet, todos os acontecimentos que nesses últimos 90 anos nós chamamos de históricos. Mas a verdade é que a história de Dona Clemência tem seus próprios marcos.

Numa idade que já nem lembra mais saiu da sua cidade natal, Caculé, na Bahia, e foi com a família viver em São Paulo, em Presidente Venceslau. Quando casou, a vida por lá ficou difícil e ela decidiu vir para Ivinhema "quando ainda era só mato por aqui". Aqui teve parte de seus dez filhos e perdeu três deles.

A senhora descreve Ivinhema como o "melhor lugar que morou, porque é o que traz as melhores lembranças". Ela não fala do passado, nem da morte de seus filhos como alguém que carrega uma mágoa, e se define melhor do que ninguém "sofri muito, mas não adianta nada chorar, então, é melhor dar risada". E diz que sua força vem do fato de que trabalhou na terra a vida inteira.

Hoje de manhã, a casa de Dona Clemência recebeu uma visita
domiciliar da Bandeira. Há dois anos ela tem dificuldade para andar, porque sofreu uma queda; e a visita do projeto atende justamente quem tem dificuldade de se locomover.

Os visitantes foram o médico geriatra, as nutricionistas, a futura
dentista e os fisioterapeutas, além da equipe de comunicação, e, apesar de ser tanta gente Dona Clemência não pareceu se incomodar "a coisa que eu mais gosto na vida é conversa". Ouviu tudo atentamente, se esforçou nos exames, mas vai precisar de ajuda dos filhos e netos para lembrar de todas as recomendações.

Os fisioterapeutas e o médico ficaram surpresos com a força da baiana. "Ela não está doente, está apenas cansada", diz o médico, que fez alguns ajustes na medicação e sugeriu uma lavagem no ouvido para ver se a audição melhora.

As nutricionistas fizeram algumas sugestões para melhorar a alimentação, apenas com o leite D. Clemência mostrou resistência "não gosto muito de leite, não". A estudante de odontologia observou a boca e aconselhou D. Clemência a escovar os dentes "mas eu só tenho dois", disse a senhora fazendo todos rirem mais uma vez.

Seis meses em um dia

Para o estudante de Medicina Steeven Yeh, o Bandeira Científica “É um dos poucos lugares na Faculdade de Medicina em que aprendemos a encaminhar uma pessoa, em que vemos como outras áreas funcionam”. Uma dessas pessoas foi Cícera de Souza Reis. A ficha médica da babá, empregada doméstica, doceira e dona-de-casa, acabou coloridíssima, constando quatro selos diferentes, cada um indicando uma área pela qual passaria na Faculdade de Biologia da UEMS, onde foi atendida.

“O problema que ela tinha era excesso de peso e osteoartrose. O que eu fiz foi retirar a dor dela e encaminhar ela pras áreas em que eu não podia intervir”, conta a estudante de medicina Raquel Andrade, que a atendeu. A primeira área foi a Fisioterapia, que complementa o tratamento feito com os remédios. “Encaminhamos ela para dar continuidade à fisioterapia na UBS”, conta o fututo fisioterapeuta Paulo Mota. A Unidade Básica de Saúde que atua em Ivinhema é responsável pela continuidade de parte dos tratamentos dos bandeirantes.

Mota conta que não é comum estudantes acompanharem casos de outras áreas. “Na Bandeira, é diferente. Já acompanhei o tratamento da medicina só porque o caso é interessante. Temos proximidade com a área do outro”. A fisioterapia ainda fez com que Dona Cícera fosse encaminhada para mais uma especialidade, a dermatologia, devido a um olho de peixe que identificaram em seu pé.

A paciente já tinha passado por três áreas antes do final da tarde, quando foi atendida pela Nutrição. Depois de uma longa entrevista, a estudante Priscila Koritar foi apontando os problemas nos hábitos alimentares de Dona Cícera, que encarou a médica com surpresa quando ficou sabendo que o grupo do leite tem que ser consumido três vezes ao dia. Outro choque foi que deveria diminuir o consumo de óleo em sua casa para meia lata por mês – a família de Dona Cícera consome quatro latas mensalmente. “Eu como bem, não vou negar pra você não”, explicou com bom humor.

“Passar por quatro médicos, eu faria isso em seis meses. Eu fiz isso em um dia”, conta a paciente, que só saiu do atendimento para almoçar - quase uma rotina de bandeirante. Agora o desafio é fazer esse dia valer. “Vou mudando aos pouquinhos [a alimentação], já estou mudando”.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Social

Hoje é dia de integração entre os bandeirantes aqui em Ivinhema. Finalmente um descanso para as equipes.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Na salas de aula

A Escola Estadual Senador José Müller se transformou na central de atendimento da Odontologia da Bandeira deste ano. Junto aos estudantes de Nutrição a equipe de Odontologia recebe as crianças para um misto de ensino e atendimento.

É na Escola, também, que a Odonto - como é chamada por aqui - faz os moldes e as 20 próteses que são doadas às pessoas da cidade e passam a noite trabalhando para terminar a tempo. Até a Fonoaudiologia foi à Escola para ajudar os pacientes que receberão as próteses a se adaptarem melhor.
Abaixo ficam algumas fotos do atendimento às crianças:

O primeiro passo é preparar as dependências da Escola para receber os pequenos






"Bolinha, bolinha, bolinha! Trenzinho, trenzinho, trenzinho", gritam as crianças ao aprenderem os movimentos de escovação. Na sala de aula elas aprendem sobre a pirâmide alimentar e sobre a forma correta de escovar os dentes



Em seguida, é colocado um contraste na boca que destaca as placas e é feita a avaliação dos dentes





As crianças têm que colocar em prática o que aprenderam sobre a escovação e são assistidas de perto pelos futuros dentistas







Quem tem cárie vai para a sala de tratamento, quem não tem fica com as nutricionistas fazendo joguinhos para testar se aprendeu sobre a alimentação




Por fim, as crianças ganham um kit para a escovação e brinquedos com a equipe de Nutrição que faz brincadeiras antes de todo mundo ir embora